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Em negativo fica o 26 de Agosto.

27.8.06


Duas da tarde.
Lembro-me de estar à janela do sótão a olhar a luz. Senti que existe um Sol que só pertence a Sábado.
Vestido branco é a única peça de roupa que utilizo quando quero sair para brincar. É hoje, Serralves é hoje.
E foi.

Repito.
O caminho que te vês a fazer até lá é, só por si, um crime.
Gosto de ouvir a cidade a falar noutras línguas. Está calma e esticada, cheia de tempo para tudo. Está de férias.

Depois encontras-te naquela generosidade do Siza.
É qualquer coisa que há nele de perceber um espaço e de o integrar. Ou de o deixar estar lá, como se não estivesse.

Não levanta paredes, explica-te a vida através delas.
Abre-te uma janela ao fundo de um corredor que quase juras que afunila até cima, de forma a perceberes o mais básico dos passos: só cresces a andar. Quando te sentes a acelerar pernas, porque te vês preso num caminho de um só sentido, é garantido que te rasga uma janela de vista larga, numa parede tão alta que a nuca não consegue vergar num só movimento até nomear o topo.

Gosto da forma como sou tratada pelo Siza.
Gosto de pessoas que sabem muito mais da vida do que eu e me a ensinam assim, com dose igual de franqueza e afago.
Ético. Astuto. Cordato. Aparece nas passagens e sai de cena, como quem murmura
.
vá, agora aprende com esses.

E esses têm sempre horas de Trabalho para partilhar,
para te atreveres a perceber,
para quereres crescer.

A minha cidade tem um Museu de Arte Contemporânea.
Gosto destes palcos de intervenção.
Dedos de deuses assim, a gosto de roto e nu.

As peças que vão a cena nos mais distintos Museus do Mundo vêm sempre cá passar. Vil privilégio este, o de saber esperar.
E, se esperas em corredores esguios, tens como certeza adquirida que a janela que se abre rasga dentro todas as hipnoses que te ensarilham.

O ensinamento, que hoje trago pelo peito, vem de uma Mulher.
Que abandonou Hamburg para crescer em Caracas. Género andorinha migratória que procura uma quebra de tecto com vista longa e elevada para encolher e aninhar.

Trabalhou tão simplesmente arame,
porcas
e parafusos.

Conheci mais uma mulher para quem não existem espaços fechados. Não lhe vi um único limite, apenas capacidade intelectual para conferir uma sustentável leveza a cada importunável eterno retorno.
Conheci o puzzle que resolveu na vida. Obstinada.
A lição que lhe trago estudada, em horas de observação, prende-se com a capacidade de nunca negligenciarmos características próprias quando perdidas pelos ermos atalhos de um labirinto.
Leve, conheci uma mulher muito leve.
Quando se tem o poder de interpelar, não se pode perder o centro. Dele depende o equilíbrio.
Tão simples assim! Resolves as tuas questões em geometria que se descreve por arame sem nunca perder a capacidade de dançar com uma corrente de vento.

Como dizê-lo de outra forma!?
Despe-te de teorizações e lança-te no absoluto do experimentalismo.
Atreve-te.
Vê cada peça por si só.
Pensa-a no todo complexo e desloca o teu corpo pelo espaço. É importantíssimo que te laves de condutas de prostituição social e te desloques no espaço.
Encolhe-te.
Aninha-te.
Gira em torno delas,
com elas,
permite-te à percepção do efeito visual
ou nunca lhes conhecerás a profundidade.
Dança as voltas necessárias.
Mas não venhas embora sem ver tudo aquilo que eu vi.

Gego.
É o nome da Mulher que mudou a perspectiva que ainda ontem tinha desta vida que me anda a viver.
O Vira Vento gira desde duas horas atrás. Sem descanso.
Na janela virada a norte.
Vale o que vale, bem sei.
Mas aquilo que me trouxe hoje foram Sopros. De Mudança.

posted by SCS
agosto 27, 2006